terça-feira, 6 de outubro de 2009

Janela de Passagem

(parte 4)

Apoiado na janela, observando o mulatinho, estava André, ‘o ator’. Ator mesmo de comercial de pasta de dente e remédio para diarréia. Nada mais.
Prezava por ter uma inspiração igual a do moleque.
Mas o desprezo das pessoas pelo seu amor ao teatro haviam o levado ao fundo do poço.
Observava o menino relendo um roteiro o qual um dia era pra ter feito. O relia todo dia; toda hora, só para saber que erro cometera ao ter encenado na frente dos juizes. Nunca achava um 'porque', e quando achava não tinha certeza se era por isso, sentia que nunca iria saber...Mas de uma coisa sabia: estava louco para ir comprar a sua Vodka Russa falsificada no bar da esquina, isso sim! Isso sim o deixava feliz.

Olhou para a janela apenas para ver se anoitecia calmamente. Mas trombou seus olhos com Morena, a qual gritava para João ir logo abrir aquele maldito portão.


(parte 5)

Morena chegava em casa com suas sacolas: leite, açúcar, pão; alface, tomate, salsinha; laranja, banana e carambola.
João procurava por balinhas devolvidas como o troco entre elas.
Não as achava, se desinteressava, e ia, novamente, em busca de voar.
Morena arrumava umas coisas ali, ajeitava umas panelas aqui, e preparava a janta.
Ligava a TV enquanto o fazia. Hora sagrada: novela; assunto do dia amanha na manicure, quando desviados da vida de outro cidadão.
Olhava pela vidraça embaçada da janela a lua querendo se mostrar.
Panela, Salsinha, Novela...Tudo feito, tudo pronto.
Acabou-se mais um episódio daquela vida de ficção.
Iria viver a sua realidade; iria se por na janela, naquela mesma janela que horas antes João brincara com seu avião.
Ficaria ali, em estátua, esperando Seu José voltar.
Mas porque ficava esperando seu marido embriagado, que agora estava jogado em qualquer bar de esquina, para que voltasse e repetisse as mesmas dores da noite anterior?
Porque aquele coração infeliz pulsava incansavelmente por aquele amor já inexistente; pulsava pela ultima gota de sangue que as desculpas eram válidas, e de aquilo jamais iria acontecer...

Perdida na sua espera e nos seus pensamentos ouvia os passos impacientes vindos do andar superior.

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